Ai senhor das furnas
que escuro vai dentro de nós
rezar o terço ao fim da tarde
só para espantar a solidão
rogar a deus que nos guarde
confiar-lhe o destino na mão
que adianta saber as marés
os frutos e as sementeiras
tratar por tu os ofícios
conhecer-lhe o corpo pelos sinais
e do resto entender mal
soletrar assinar de cruz
não ver os vultos furtivos
que nos tramam por detrás da luz
ai senhor das furnas
que escuro vai dentro de nós
a gente morre logo ao nascer
com olhos rasos de lezíria
de boca em boca passar o saber
com os provérbios que ficam na gíria
de que nos vale esta pureza
sem ler fica-se pederneira
agita-se a solidão cá no fundo
fica-se sentado à soleira
a ouvir os ruídos do mundo
e a entendê-los à nossa maneira
carregar a superstição
de ser pequeno ser ninguém
e não quebrar a tradição
que dos nossos avós já vem.
Carlos Tê